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Aplicação da medida inquieta contribuintes
Na Receita Federal, quem busca informação sobre a medida não consegue compreender quando e de que maneira irá se beneficiar.
Anunciada pelo governo federal em dezembro de 2008, a Medida Provisória 449  trouxe uma esperança para quem estava endividado, com a promessa de amenizar os  débitos dos empresários através da remissão sobre as dívidas consolidadas iguais  ou inferiores a R$ 10 mil vencidas há cinco anos ou mais - até 31 de dezembro de  2005. Na prática, porém, os efeitos ainda não estão correspondendo à  expectativa. 
Na Receita Federal, quem busca informação sobre a medida não  consegue compreender quando e de que maneira irá se beneficiar. A desinformação  dos atendentes, em Porto Alegre, desaponta os devedores e denota falta de  articulação entre os setores do governo que criam e os que executam as leis.  "Estive na Receita em 2008 para verificar a baixa de débito de um cliente, e o  funcionário não sabia qual procedimento adotar. Pior do que isso, ele também não  tinha previsão de quando se poderá ter o perdão das dívidas e como eu devo  proceder", afirmou o contador Leonardo Galisteo, enquanto aguardava para ser  atendido no guichê.
Ele é um entre os diversos contribuintes que espera  determinação do governo em relação à regularização da norma, enquanto o órgão  federal se organiza para adequar o sistema de dados. Chefe-substituto da Divisão  de Arrecadação e Cobrança da Superintendência da Receita Federal, Ricardo  Diefenthaeler, justifica a demora das remissões pela complexidade de agrupamento  das informações. "Este procedimento será eletrônico e está sendo programado. O  próprio sistema irá contabilizar os casos pelo banco de dados e cada grupo será  tratado individualmente", afirmou. 
A expectativa criada no contribuinte após  o governo declarar que a MP aliviaria a cobrança gera desconforto ao não se  realizar. "A Receita precisa se organizar e dar mais atenção às pessoas  organizadas. Sem isso, a gente fica com expectativas que não são  correspondidas", protesta o contador.
Sendo válido mesmo para débitos em  processo de execução judicial, em cobrança administrativa ou com exigibilidade  suspensa, o benefício pretende atingir 453 mil pessoas físicas e 1,6 milhão de  empresas. Conforme o Ministério da Fazenda, existem 2,1 milhões de dívidas  passíveis de perdão, ou seja, 18% dos processos inscritos em dívida ativa da  União. No entanto, o valor total dos débitos perdoado até o momento equivale a  zero, já que a medida ainda não é aplicada.
Ao explicar a diferença entre  remissão e decadência, Diefenthaeler salientou que a medida não é redundante e  apresenta um diferencial em relação ao regulamento existente. "A remissão é o  perdão de dívidas, mesmo quando já houve cobrança. Já a decadência é quando  passa o tempo e não é cobrado." Ele ressalta a diferença entre anistia e  remissão, explicou que a primeira representa perdão de multas e a segunda, de  tributos. 
A insatisfação do contribuinte, para ele, será resolvida assim que  o governo anunciar a regularização da MP 449, e os débitos forem abatidos  automaticamente. Como nem sempre os cidadãos acompanham as medidas tomadas pela  Justiça, é normal que nesse caso, alguns tenham mais pressa, principalmente  porque o prazo para regularização do cadastro do Simples Nacional expira dia 30.  
Embora a previsão de início da remissão das dívidas seja para março,  Diefenthaeler informou que o sistema que irá gerenciar esse procedimento ainda  está sendo desenvolvido, e que poderá levar algum tempo para ficar pronto.  Quando isso ocorrer, ele garante que ninguém será prejudicado com a eliminação  do Simples. "Quem estiver adequado aos requisitos da MP 449 terá a sua remissão  garantida, e se perder o Simples por causa dessa demora, poderá recorrer,  justificar e conseguir retornar", afirmou. 
Desinformação deflagra  despreparo da Receita, diz advogado 
A MP 449 oferece duas opções que  interessam aos devedores: o parcelamento de débitos, proposto no artigo 1, e a  remissão da dívida, no artigo 14. Na teoria, parte das dívidas deveria ser  perdoada e outra parcelada com a medida. No entanto, o benefício ainda não está  se verificando na prática e o fato preocupa quem inicialmente ficou otimista com  a nova norma. 
Tendo procurado a Receita Federal para buscar orientação para  um cliente, o advogado tributarista Henrique Sampaio Goron foi informado pelo  atendente de que não há regulamentação para o caso, e que o mesmo não teria  determinação de como agir no parcelamento. Classificando a medida de redundante  e eleitoreira, Goron entende que a MP não acrescenta novidade e não se efetiva  no que poderia ser útil. 
Ao criticar a postura do órgão federal em relação  ao atendimento, o advogado ressaltou a necessidade de regulamentação urgente,  sem a qual o usuário não pode obter o benefício. "A Receita está desorganizada,  não está preparada para colocar em prática o que o governo propôs", afirma.
O  advogado chamou atenção para o fato de inúmeros empresários perderem o prazo de  inscrição no Simples devido ao não-parcelamento de suas dívidas. "Uma empresa  deixa de aderir ao Simples Nacional se tem débitos em aberto e esses débitos  poderiam ser colocados na MP 449, se ela tivesse regulamentação", explica.  
Morosidade no sistema justifica descompasso 
A morosidade com que o  governo está tratando a medida é causa da insatisfação da maioria dos  contribuintes em relação ao tema. No entanto, o que muitas pessoas desconsideram  é que a Justiça precisa de tempo para contabilizar e caracterizar todos os seus  devedores. "Até ficar pronto o sistema, tem que atingir toda uma gama de  tributos e recuperar as peculariedades dos registros, reconstruindo uma espécie  de retrato das finanças de cada contribuinte", afirma Maria Angélica Flores  Orth, chefe da Divisão de Interação com o Cidadão da Superintendência da Receita  Federal. Ela informa que a remissão foi tratada pela MP antes de os sistemas  serem preparados para dar conta de tantos processos.
A adaptação de um  sistema de dados para controlar o perdão das dívidas leva tempo, mas ele não  deixará de ser válido por causa disso. Como ele será automático e eletrônico, a  intervenção do contribuinte no sistema não será necessária, mas caso seja, a  Receita irá avisar no decorrer do ano. 
Maria Angélica diz que o valor de R$  10 mil será perdoado separadamente por grupos de tributos, como os fazendários,  contribuições previdenciárias e tributos que já estão na Procuradoria. "Há uma  apuração para cada grupo e o total de dívidas tem que ser inferior a R$ 10mil em  cada um dos grupos", afirma. 
Atraso na MP 449 deixa empresário fora do  Simples 
Com dívidas acumuladas em até R$ 26 mil, o empresário  porto-alegrense Claúdio Roberto animou-se ao assistir na televisão a notícia da  remissão dos débitos de até R$ 10 mil pela Receita Federal. Imaginando que  poderia parcelar ou abater parte de sua dívida ainda em 2008, recortou todas as  matérias que encontrou nos jornais sobre o tema e procurou auxílio de  profissionais da área jurídica para saber como obter o benefício.  
Proprietário de uma empresa que atua no setor têxtil há 25 anos, ele teve  que demitir mais de 20 funcionários, entre diretos e indiretos, para manter vivo  o seu negócio. Cláudio procurou a Receita e foi encaminhado para a Procuradoria.  Lá, foi informado de que não teria direito ao benefício. Na iminência de perder  o direito ao Simples por causa da falta de normativa para a execução da MP, ele  considera que o órgão federal demonstrou descaso, desarticulação e falta de  informação sobre o tema. 
Inércia do governo poderá levar contribuintes à  Justiça
A edição da medida provisória editada pelo governo federal, que  concede benefícios significativos aos contribuintes - remissão, parcelamentos,  redução de multas e transação tributária dos débitos -, depende ainda de  regulamentação, gerando, com isso, sérios problemas aos contribuintes. Um  exemplo é a não-concessão de certidão negativa sobre o débito. Segundo o  coordenador da Divisão Tributária da Fahrion & Advogados e presidente da  Academia Brasileira de Pesquisas Tributárias, Roberto Villa Verde Fahrion, a  remissão autorizada por lei deverá ser objeto de ato administrativo da  autoridade tributária federal, podendo ser provocado pelo contribuinte na forma  legal. Caso persista a inércia do governo em não regulamentar a medida,  empresários ou pessoas físicas poderão buscar no poder judiciário a guarida  necessária, obtendo a Certidão Negativa do Débito. 
Em relação aos débitos  tributários superiores a R$ 10 mil, Fahrion explica que a MP trouxe a  possibilidade de serem os mesmos quitados através de parcelamentos, com teto  máximo de 120 parcelas, com redução do percentual das multas administrativas  aplicadas. "A MP deveria contemplar uma forma mais adequada de composição dos  débitos tributários às pessoas jurídicas que buscam recuperação ou  reestruturação." 
A imposição do teto máximo de 120 meses para parcelamento  das dívidas torna-se letra morta para algumas empresas que até mesmo buscam a  sua recuperação no âmbito judicial, conforme os moldes da Lei 11.101/2005. Para  ele, a imposição é desproporcional ao faturamento e, também, pode prejudicar a  efetiva recuperação do negócio, manutenção da atividade econômica, empregos ou  recolhimento de tributos.